19/06/2010

CIÊNCIA E FÉ PODEM CAMINHAR JUNTAS


Palavra ministrada na Faculdade de Araxá ligada à UFU, em mesa redonda sobre “células tronco”

Sou grato à Betinha pelo convite para participar deste evento especial. Creio que este tempo não será um tempo perdido. Está aqui um povo tocado pelo desejo de saber mais. Pelo desejo de conhecer o novo. Pela curiosidade que o move para coisas mais altas.
Para começar, eu quero expressar minha fé e esperança na Ciência como cooperadora na edificação da obra de Deus.

1 - Um dos múltiplos desejos que mantém o homem vivo é o desejo do conhecimento. Miserável a nação que anda nas trevas do desconhecimento. Será sempre uma nação manipulada pelos mais espertos. Em um de seus livros, a Bíblia traz uma acusação séria de Deus: "... o meu povo é destruído porque lhe falta conhecimento". Se ele puder ser ouvido, esta mesma acusação ele faz a nós, neste 2008.

Não tenho dúvida nenhuma que o século 21 será, em semelhança ao século 20, marcado por uma forte influência da ciência na vida das pessoas. Em qualquer área do conhecimento, mas principalmente aquela que se relaciona com as biotecnologias, já temos experimentado um avanço extraordinário. No que diz respeito aos avanços na área da genética, o fluxo de novas informações é tremendamente alto. O quanto esse conhecimento cresceu desde a descoberta que fizeram sobre a estrutura do DNA.

2 - Hoje, o que mais nos chama a atenção é a grande expectativa para a cura de determinadas doenças a partir da pesquisa com células-tronco embrionárias. Essas células podem se transformar em qualquer um dos tecidos humanos. Doenças neuorológicas degenerativas, como o Parkinson ou Alzheimer; doenças musculares, como a distrofia ou paralisias; males como a paraplegia ou tetraplegia, ou o diabetes entre outros, poderiam ser resolvidos a partir das células-tronco. Por isso essas células são as mais cobiçadas pelos geneticistas e o alvo de uma intensa discussão bioética. Esta discussão se tornou uma batalha da ciência contra, em especial, a Igreja, Católica, vista como inimiga retrógrada da ciência e até mesmo como adversária da vida. E cada vez mais cresce o debate em torno de quando começa a vida, particularmente a vida biológica e como fazer experimentos com células-tronco embrionárias, já que com relação às células-tronco adultas há tranqüilidade. Duas questões fortes estão presentes: até que ponto podemos dispor da vida humana e se todo conhecimento científico que temos hoje nos legitima a usá-lo.

Diante desta posição, aparentemente fundamentalista e cruel da igreja, o ateu reforça o seu ateísmo, os “não-religiosos” levantam seus punhos, os políticos montam seus palanques, os historiadores pequenos abrem os arquivos da triste história do passado, os fiéis se sentem perdidos e ambivalentes em suas posições. Ou mais, nossos conceitos intelectuais de vida estão sendo sacudidos e nossos preconceitos irracionais estão se aflorando. Há uma guerrinha da Ciência versus Fé, da Ciência versus Deus, da Ciência versus Igreja. Eu arriscaria a dizer: há uma guerrinha do significado da ciência versus o significado de Deus. E as pedradas maiores estão sendo lançadas mais sobre a Igreja Católica.

3 - Não é minha intenção e esforço convencer ninguém de nada, a não ser a de que Deus está no governo de todas as coisas e de todas as pesquisas. Ele ama a curiosidade do homem. Ele ama a pesquisa.

Deus ao criar o homem não criou para ele um boneco eletrônico que Ele pudesse manipular à sua vontade, ou com que Ele pudesse brincar. Mas criou um ser superior a toda e qualquer criação que, também pudesse, em liberdade, descobrir e criar, assumindo a responsabilidade de seus atos. Deus respeita a liberdade do homem que Ele criou, sem abandoná-lo, sem deixar de falar, de exortar e de abrir oportunidades para que ele não se perca por falta de conhecimento. Ao Senhor Deus agrada o homem pesquisar: “Buscai e achareis”. Está escrito na Bíblia que Deus deu a um a palavra da sabedoria, a outro, a palavra da ciência, a outro, a fé, a outro dons de curar... - 1 Coríntios 12:8-9.

A Igreja cristã – católica ou evangélica – tem o seu código maior de ética, a Bíblia, ou como comumente chamamos Palavra de Deus que é "viva e eficaz, e mais cortante que a espada de dois gumes, e que penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas" - Hebreus 4:12. Como qualquer entidade que tem seu código de ética, a fidelidade da Igreja é cobrada sempre. O que estou querendo dizer? É que o meu papel neste debate não é o de querer convencer, “na marra”, os senhores de minhas convicções. Mas, com base no meu código, ajudar na reflexão sobre a complexidade da vida.

4 - E eu quero dizer: a crença em Deus e em sua Palavra pode ser uma opção completamente racional e que os princípios da fé são, na verdade, complementares aos da ciência. Creio no que disse Albert Einstein: “a ciência sem a religião é manca; e a religião sem a ciência é cega”. Eu, particularmente, considero que a medicina e a ciência de um modo geral são fruto da graça comum de Deus para o bem dos homens. E, neste particular, estaria o uso das células-tronco para a cura de múltiplas doenças. A argumentação contrária é a de que o homem estaria criando vida, atributo que pertence a Deus. Pela carência de uma certeza consistente, os preconceitos de ambos os lados estão na base da discussão. Na raiz dos preconceitos, muitas vezes, está a ignorância congênita ou a ignorância voluntária. Precisamos de cuidados, porque discussões movidas a emoções sufocam a racionalidade das pesquisas.

5 - No primeiro semestre do século 21, a humanidade atravessou uma ponte rumo a uma nova era de tremenda importância. Ao mundo inteiro foi apregoando que o primeiro rascunho do Genoma Humano havia sido concluído.

O líder do Projeto Genoma Internacional, Francis S. Collins, estava junto com o presidente Bill Clinton, no grande anúncio. Em certo momento, Clinton, em seu discurso, chamou a atenção, quando disse: “Hoje, estamos aprendendo a linguagem com a qual Deus criou a vida. Ficamos ainda mais admirados pela complexidade, pela beleza e pela maravilha da dádiva mais divina e mais sagrada de Deus”.

Francis Collins se assustou ao ouvir, naquele momento, uma referência religiosa tão espalhafatosa. Acontece que ele, líder do projeto genoma havia trabalhado no discurso de Clinton. Só restou a ele concordar e dizer: “É um dia feliz para o mundo. Para mim não há pretensão nenhuma, e chego mesmo a ficar pasmo ao perceber que apanhamos o primeiro traçado de nosso manual de instruções anteriormente conhecido apenas por Deus”.

Hoje, perguntamos: Por que um presidente e um cientista, no comando do anúncio de marco da Biologia e da Medicina, se sentiram impelidos a evocar uma conexão com Deus? Não existe um antagonismo entre a visão científica e a visão espiritual do mundo, como esta quase guerra entre igreja e ciência na questão da pesquisa das células-tronco? Quais os motivos para evocar Deus nesses dois discursos? Poesia? Hipocrisia? Uma tentativa cínica de bajular as pessoas religiosas ou de desarmar as que talvez criticassem o estudo do genoma humano como se este reduzisse a humanidade a um maquinário? Não. Francis, o cientista, tinha consciência que a experiência de mapear a seqüência do genoma humano e descobrir o mais notável de todos os textos foi, ao mesmo tempo, uma realização científica excepcionalmente bela e um momento de veneração.

Muitos, por falta de conhecimento dos dois mundos – o da ciência e o da fé – ficam por entender como um cientista que trabalha com rigor não possa também acreditar seriamente em um Deus. Mas este cientista sério e crente sabe que a crença em Deus pode ser uma opção completamente racional e que os princípios da fé, são na verdade, complementares aos da ciência.

6 - Nos tempos modernos brasileiros, a síntese das visões cientifica e espiritual do mundo é tida por muitos como impossível. Pesquisas, porém, mostram que esta relação não é tão absurda. Ou seja, a ciência e a religião talvez não estejam tão claramente separadas quanto parece. Pessoalmente, não gosto muito do termo “religião”. Religião tem sido causa de morte de muitos valores, como foi ela que matou Jesus Cristo, de distorções do caráter, de tremendas hipocrisias e invencionices confrontantes com o Deus da Bíblia. Um dos causadores, no Brasil, da cultura da corrupção e da criminalidade, é ele ser mais religioso que cristão! Eu prefiro, neste momento específico, os termos mundo da ciência e mundo do espírito.

A guerrinha em que estamos envolvidos ou assistindo é, no fundo, não a ciência contra a igreja, mas, sim, o mundo natural contra o mundo espiritual, o mundo da descoberta científica contra o mundo da revelação. E esta batalha somos nós que a criamos. Porque para Deus é muito bom que o homem da ciência coopere com Ele para o bem estar de suas criaturas. Todavia, não há como negar: bombas são jogadas de ambos os lados e os perdidos, por falta de conhecimento, entram nesta batalha com afirmações inconseqüentes. Por exemplo, a do evolucionista Richard Dawkins: é preciso ser ateu para acreditar na evolução. Eis uma de suas diversas afirmações estarrecedoras: “A fé é a grande enrolação, a grande desculpa para fugir da necessidade de pensar e de avaliar as evidências. [...] A fé, por ser uma crença que não se baseia em evidências, é o principal vício de qualquer religião”.

Do outro lado do debate, determinados fundamentalistas religiosos – novo nome para radicalistas e conservadores - atacam a ciência, condenando-a de perigosa e não confiável, e apontam uma interpretação ao pé da letra dos textos sagrados como única forma crível para discernir a verdade científica.

7 - Este clima de antagonismos faz com que vários observadores sinceros se sintam confusos, culpados, amaldiçoados e desanimados. Pessoas de bom senso concluem ter a obrigação de escolher entre duas posições extremas, sem esperança de consolo. Decepcionados, muitos optam por rejeitar tanto a confiabilidade das conclusões científicas como o valor da religião organizada, preferindo às diversas formas de pensamento anticientífico ou a alguma forma vazia de espiritualidade, ou se entregar ao nada. Outros decidem aceitar, ao mesmo tempo, os valores da ciência e os do espírito, porém, sem compromisso com a vida. Com base nessas premissas confusas, o biólogo Stephen Jay Gould acreditava que ciência e fé deveriam ocupar “ofícios separados, e não sobrepostos”. Contudo, esse tipo de posição leva a conflitos internos e destitui as pessoas da oportunidade de adotar a ciência ou a fé de um modo que as satisfaça totalmente.

8 - Eis aqui uma pergunta: nesta era moderna de tantos fatos polêmicos como aborto, eutanásia, doação de sangue, morte cerebral, clonagem, cosmologia, evolução, genoma humano e, agora, células-tronco e manipulação de embriões, será que ainda existe a possibilidade de uma harmonia satisfatória entre o científico e o espiritual? Eu respondo que sim! Não há conflitos entre ser um cientista que age com severidade e uma pessoa que crê num Deus que tem interesse pessoal em cada um de nós. O domínio da ciência está em explorar a natureza. Isto é vontade de Deus. Para isto Deus deu a alguns o dom da ciência. O domínio de Deus encontra-se no mundo espiritual, um campo que não é possível esquadrinhar com os instrumentos e a linguagem da ciência; deve ser examinado com o coração, com a mente e com a alma – e a mente deve encontrar uma forma de ajuntar os dois campos.

Vou fazer uma afirmação que pode causar estranheza. Nada que o cientista descobre é novo. Tudo já existe no mundo espiritual. O cientista, simplesmente, torna visível o que é invisível. A realidade está no invisível. O visível tem durabilidade limitada. A Bíblia afirma: Nós vivemos por fé e não por vista. Isto tem cheiro de filosofia, mas é bíblico. A Bíblia não filosofa. Bem-aventurado é o cientista que consegue transformar em realidade o que está oculto em Deus, desde a eternidade. O cientista é um homem de Deus a serviço da vida. É nele que o cientista vai pesquisar o significado da vida.

9 - É possível, sim, ciência e espírito coexistirem em qualquer indivíduo. Este fato é graça para a experiência humana. A ciência é a única forma confiável para entender o mundo da natureza. E as ferramentas científicas, quando utilizadas de maneira adequada, podem gerar profundos discernimentos na existência material. A ciência, entretanto, é incapaz de responder a todas as questões existenciais. Uma das necessidades mais fortes da humanidade é encontrar respostas para as questões mais profundas, e temos de apanhar todo o poder da ciência e da fé, para buscar a compreensão tanto daquilo que vemos como do que não vemos. Na Bíblia há uma afirmação que resume o que estamos dizendo: “... o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, pois lhe parecem loucura, e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. Mas o que é espiritual discerne bem a tudo, e ele de ninguém é discernido” – 1 Coríntios 2:14-15.

Eu li em algum lugar uma afirmação própria de um ateu: “nenhum cientista pensante poderia cogitar seriamente a possibilidade de Deus sem cometer um tipo de suicídio intelectual”. Pode pensar, sim. Há muito cientista sério, acima de muitos phds, que pensa seriamente na possibilidade de Deus presente em suas pesquisas e continua intelectualmente muito vivo. Além do mais, a sua intelectualidade não veio dele, veio do Alto.

10 - Meus amigos, quero como um cristão, expressar um desejo. Um dia, fé e ciência hão de celebrar o grande acordo daquilo que hoje tem gerado dúvidas na sociedade porque as partes se degladiam irracionalmente. E será uma celebração madura, sem ingredientes emocionais, sem o uso e o abuso da miserabilidade das enfermidades e das deficiências físicas, sem narizes tortos e, principalmente, sem manipulações políticas e econômicas. Infelizmente, a maioria de todos os processos de pesquisa para dar graça e vida aos cansados e atribulados, se deixa contaminar por fortes interesses políticos e econômicos. Isto é um ingrediente maldito que contamina e corrompe todo propósito social, inicialmente, bem intencionado. Mas, enquanto a ciência continua investigando o que há de natural na célula-tronco, a fé continua buscando respostas a diversas questões espirituais que cercam esta saudável e abençoada pesquisa.

Vamos juntos nesta!
Por: Pr Euler P. Campos

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